quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

Personagens - Frei Luís de Sousa

Personagens

D. Madalena de Vilhena

                  Logo na primeira cena D. Madalena é colocada na esfera dos amores míticos funestos, em que os amantes se tornam vítimas do sentimento que nutrem. É dominada por pressentimentos, temores e terrores, o que a caracteriza como nitidamente romântica, já que os sentimentos superam a sua capacidade lógica e analítica.
                  Vive em permanente desassossego, pânico, infelicidade (Pathos) e pelo imenso sentido do dever, o que inibe a possibilidade de se sentir feliz, mesmo por que a sua personalidade vulnerável e frágil, fá-la duvidar quanto à  existência do seu primeiro marido (dúvida alimentada pelas convicções de Telmo).
                  Sente-se eternamente culpada por ter amado Manuel de Sousa quando ainda se encontrava casada com D. João (Hybris), por isso é dominada pelo destino e pelo fatalismo, vivendo toda a sua vida receando o aparecimento do seu primeiro marido, e quando este aparece, disfarçado de Romeiro, não o reconhece.
                  È uma personagem que vive muito para si, dentro dos seus problemas pessoais e da sua família, não revelando outros interesses, o que transmite o ambiente social do início do séc. XVII.

 

Manuel de Sousa Coutinho

                  Manuel de Sousa era um Cavaleiro de Malta, o que o situa imediatamente na esfera do Bem. Os cavaleiros de Malta dedicavam-se a uma obra que se dividia entre as acções de beneficência e militar ao serviço da comunidade cristã.
                  Manuel de Sousa tinha um carácter altruísta (humanitário, dedica-se a fazer o bem para os outros)  e patriótico, sempre zelou pela integridade.
                  Apresenta, contudo, duas facetas antagónicas: por um lado age como um ser dominado pelo raciocínio, não acreditando nos pressentimentos de sua esposa e filha, e pelo sentimento patriótico e liberal, o que o leva a incendiar o seu próprio palácio (Hybris), impondo-se, sendo por isso livre nas suas resoluções; por outro lado, no III acto, é assolado pelo desespero e pela culpa, ao constatar a situação de ilegitimidade da sua filha e desonra de sua esposa. Assim, o seu sentimento da honra e do dever,  revela- -o intransigente (o que já tinha acontecido relativamente ao incêndio) na decisão imediata e incontestável de tomar o hábito.

 

Maria de Noronha

                  Maria é um ser puro e frágil. É vítima de duas situações que não pode dominar: a debilidade física devido à doença (tuberculose) e a condenação social como filha ilegítima (após a chegada do Romeiro). A sua morte é a Catástrofe.
                  Ao nível psicológico tem um desenvolvimento precoce. É adulta nas suas preocupações sociais («Coitado do povo!» até «... amparo aos necessitados» I acto, cena V) e pela cultura (leitura de Menina e Moça de Bernardim Ribeiro).
                  Entusiasta, ávida de emoção e de aventura, sonhadora, incarnava o ideal liberal, que se traduzia numa vontade de transformar o mundo e lutar pela justiça social. A sua pureza e bondade naturais conduzem-na, sob a influência de Telmo, a partilhar a esperança que dominava os sebastianistas, pois encontrou no mito sebástico a sua forma de se rebelar contra a opressão política e social que marcou o Portugal da época e de acreditar numa sociedade dominada pela fraternidade, pela igualdade e pela justiça.
                  Maria é, ainda, a projecção da filha do autor devido à sua ilegitimidade e ao seu carácter idealizado.

 

Telmo Pais

                  É um fiel servidor de seus amos e condensa em si próprio o passado (ligação a D. João), o presente (fidelidade à família de D. Madalena) e o futuro (antevisão dos acontecimentos que se vieram a concretizar), encontrando-se dividido sentimentalmente: por um lado, movido pela honra e pelo dever guarda uma fidelidade absoluta a D. João; por outro dedica um amor extremoso a Maria o que o leva a hesitar entre esta e D. João.
                    Ao nível da acção, pelos agouros e profecias que caracterizam o seu discurso, desempenha um papel semelhante ao do coro das tragédias clássicas, que tinha como função comentar a acção e indiciar o seu desfecho trágico.
                  Naturalmente é um sebastianista, pois crendo no regresso de D. João, acredita também em D. Sebastião como o messias que viria salvar Portugal das garras dos espanhóis.

 

D. João de Portugal

                  A sua ligação ao mito sebastianista é evidente, motivo pelo qual representa o Portugal de outrora.
                  É uma personagem sempre presente ao longo da peça. Toma diversas formas: personagem apenas referida; personagem simbólica, sempre presente nos agouros; personagem ligada ao sebastianismo; e personagem “equívoco”/“disfarce”,, responsável pela Peripécia e Agnorisis e como motor e desfecho do conflito dramático.
                  D. João, provoca a Catástrofe inconscientemente, uma vez que, depois de vinte e um anos de cativeiro, regressa a casa, com a intenção de reaver a sua posição e encontra a sua mulher casada com outro homem. Neste momento da peça nota-se o seu elevado carácter moral, pois, uma vez constatados os inúmeros esforços empreendidos por sua esposa para o encontrar, renuncia ao seu lugar, pedindo a Telmo que informe a família que o Romeiro não passava de um impostor.

 

Frei Jorge

                  É frade domínico e irmão de Manuel de Sousa. É a personagem mediadora e apaziguadora, que procura tranquilizar as outras personagens através do consolo cristão e da fé como aceitação de todas as coisas.

                  Assume o papel de confidente, o que o leva a manifestar-se sobre os acontecimentos e pressente o desenlace trágico (II acto, cena IX – monólogo), o que lhe confere, à semelhança de Telmo, a função do coro da Tragédia Grega.

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